3 ideias práticas de experiências de aprendizagem para explorar no ensino remoto

3 ideias práticas de experiências de aprendizagem para explorar no ensino remoto

Experiência de aprendizagem é certamente um dos termos que mais veremos num futuro próximo, especialmente com a retomada das discussões envoltas na aplicação ideal da BNCC através do desenvolvimento de competências e habilidades, bem como à aderência a novos métodos, que envolvam a experimentação, a criação e, consequentemente, o protagonismo dos estudantes nesse processo.
Nesse percurso, tem ganhado espaço a teoria de David Ausubel, ainda pouco estudada e explorada nos cursos de licenciatura e pedagogia: a aprendizagem significativa. Como construir, nesse sentido, experiências de aprendizagem que não se baseiam apenas na transferência de informações? Como fica o papel do educador num cenário de constantes mudanças na educação? Como desenvolver habilidades e competências? E mais desafiador ainda, como fazer tudo isso num modelo remoto?
Primeiro, precisamos estar alinhados em um ponto fundamental: experiências de aprendizagem. Perceba que o foco não está na experiência de ensino. O nosso olhar se volta para como os estudantes aprenderão, como construirão esse aprendizado. E quando falamos de experiências, estamos falando de experimentação, de criação, de teste, de verificação, de reflexão, de momentos de aprendizagem que envolvam práticas multissensoriais, que atendam aos diversos estilos de aprendizagem, que sejam desafiadoras, mas também, motivadoras, instigantes.
A sequência didática da construção e planejamento das diversas etapas é papo para outro artigo, aqui, vamos focar na construção de desafios e atividades que podem ser feitas em diversos formatos de aula, aproveitando sempre recursos simples e baseados na BNCC.
Complicado? Na teoria, pode parecer. Mas se olharmos a riqueza de possibilidades que temos, pensando juntos, simplificamos. Vamos lá?

  • Produção de videominuto: uma ótima oportunidade para desenvolver a comunicação, a criatividade, a capacidade de síntese, a elaboração de roteiros, a produção colaborativa e a experiência autoral. Videominuto é uma das práticas que aparecem na BNCC, especialmente na área de linguagens, mas pode ser explorada em todas as áreas, propiciando produções que envolvam temáticas diversas.

Exercício: Que temática trabalharei em breve, que me possibilita utilizar esse recurso como um desafio instigante aos meus estudantes?

  •  Produção de podcast: nós já vimos por aqui uma ferramenta muito simples e online para criar podcasts com o celular ou computador, o site: https://vocaroo.com. Que tal passar esse desafio aos estudantes, para que contem histórias, realizem entrevistas breves com familiares, produzam um curto programa de rádio fictícia, criem um roteiro focado em informações científicas, identificação de fake news ou trazendo fatos curiosos ou biográficos sobre um ícone?

Exercício: Como posso aproveitar a produção de podcasts com meus estudantes, levando em consideração as temáticas a serem trabalhadas e a idade deles?

  • Exercícios que envolvam produtos que os estudantes têm em casa: a experiência de explorar um conteúdo através de produtos, embalagens, objetos que se tem em casa torna-se muito mais significativa que ver uma ilustração estática. Que tal explorar elementos químicos de um produto de limpeza? Ou a tabela nutricional de na embalagem de um alimento? E se explorarmos a história de uma civilização antiga iniciando um debate sobre a história da nossa própria família? E se trabalharmos as formas geométricas a partir de objetos que temos em casa?

Exercício: realize uma lista dos seus próximos conteúdos e temáticas e pense em formas de explorá-lo a partir de objetos que os estudantes tenham em casa. Os objetos não precisam estar inteiramente interligados ao conteúdo, mas podem se tornar um ponto de levantamento de ideias, discussões e reflexões para entrar no tema, por exemplo.
Ponto de atenção: ao final de cada processo de criação ou discussão, explorar com os estudantes o que aprenderam no processo, como conectaram os pontos, no que erraram e o que aprenderam com tal experiência.
Ideias são compartilhadas para que você, educador, adapte à sua realidade, aos seus objetivos pedagógicos e podem ser transformadas em outras ideias, que caibam ao seu público e formato de aulas adotado. Desejo que essas ideias se multipliquem em outras ideias simples, mas efetivas na construção do conhecimento nesse momento desafiador.
Seguimos juntos!


Professora Emilly Fidelix

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Educação Socioemocional

A Aprendizagem socioemocional está cada mais presente no ambiente escolar. Nem sempre construída de forma efetiva, mas já reconhecida como um critério fundamental e com impacto direto do desempenho acadêmico dos alunos. Inúmeros são os benefícios da Educação Socioemocional, o mais expressivo com certeza é a melhoria nos índices acadêmicos como afirmam diferentes pesquisas. Outro dado relevante é o desenvolvimento do autocontrole, necessário em uma época onde os noticiários nos mostram o crescimento da violência dos alunos em relação aos educadores. Além de mostrar a redução do conflito entre os alunos e sua interferência na qualidade de vida e saúde mental de todos no ambiente escolar. Porém, existe um fator a longo prazo ainda pouco discutido: o impacto das competências socioemocionais do desenvolvimento econômico. Quer saber mais, a autora Tonia Casarin nos ajuda nessa missão!

O estudo e aplicação do desenvolvimento das competências socioemocionais nas escolas é decorrente de pesquisas acadêmicas em diversas áreas do conhecimento: pedagogia, andragogia, neurociência, psicologia, educação, economia e outras ciências. Além disso, experiências atuais demonstram melhores resultados acadêmicos e sociais para crianças cujas competências socioemocionais foram mais bem desenvolvidas. Obviamente, as competências cognitivas e acadêmicas continuar sendo o cerne da educação, que passa a incorporar, de forma intencional aspectos socioemocionais na educação de alunos.  Um exemplo ocorre quando alunos desenvolvem competências socioemocionais, eles são mais motivados a participar da vida escolar e mais comprometidos.
Como outros resultados desses estudos e experiências, temos conclusões que apontam que o trabalho com as essas competências contribui para a redução do abandono escolar e para a melhoria do desempenho acadêmico, e ainda ressalta a escola como um espaço seguro para estimular o desenvolvimento socioemocional dos alunos, tornando-a central no papel de formação integral dos seus alunos. Conforme o CASEL (The Collaborative for Academic, Social and Emotional Learning), a aprendizagem de habilidades socioemocionais é uma das estratégias mais significativas para promover sucesso acadêmico e reformas escolares eficazes.
Dados mostram que a aprendizagem socioemocional melhora resultados acadêmicos, ajuda alunos a desenvolver autocontrole, melhora as relações da escola com a comunidade, reduz os conflitos entre os alunos e o bullying, ajuda os professores a manter o controle da sala de aula e ajuda os jovens a serem mais saudáveis e bem sucedidos na escola e na vida.

Dentre algumas implicações de pesquisas, uma das mais interessantes sobre crianças que participam de programas de aprendizagem socioemocional em escolas, são os estudos longitudinais, aqueles que acompanham as crianças por longo período de tempo. Esses estudos comprovam impactos em todos os anos escolares, contextos sociais e tipos de escolas.
Os resultados mostram que 23% dos alunos apresentam de melhoria em habilidades socioemocionais, 9% de melhoria em atitudes frente a escola, família e outras pessoas de seu convívio, 9% de melhoria em comportamento social e 11% melhoria em testes acadêmicos. Esses benefícios são  acompanhados de 9% a menos de problemas de comportamento, e 10% de redução em distúrbios emocionais. Além disso, os pesquisadores identificaram a redução de fatores de risco em várias áreas da vida de uma criança, envolvimento em problemas como violência, delinquência, abuso de substâncias químicas ou a reprovação escolar.
Um recente estudo de 2015 da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) faz um panorama entre dezoito países sobre o impacto das competências socioemocionais do desenvolvimento econômico de diferentes populações. As correlações indicam que, em todos os países, habilidades socioemocionais se relacionam com níveis de  renda e desemprego, graduação, obesidade, depressão, problemas de comportamento e conduta, bullying, comportamentos vitimizantes, além de indicadores de qualidades de vida e saúde física.Como outros resultados desses estudos e experiências, temos conclusões que apontam que o trabalho com as essas competências contribui para a redução do abandono escolar e para a melhoria do desempenho acadêmico, e ainda ressalta a escola como um espaço seguro para estimular o desenvolvimento socioemocional dos alunos, tornando-a central no papel de formação integral dos seus alunos. Conforme o CASEL (The Collaborative for Academic, Social and Emotional Learning), a aprendizagem de habilidades socioemocionais é uma das estratégias mais significativas para promover sucesso acadêmico e reformas escolares eficazes.
Dados mostram que a aprendizagem socioemocional melhora resultados acadêmicos, ajuda alunos a desenvolver autocontrole, melhora as relações da escola com a comunidade, reduz os conflitos entre os alunos e o bullying, ajuda os professores a manter o controle da sala de aula e ajuda os jovens a serem mais saudáveis e bem sucedidos na escola e na vida.

Outra argumentação relevante é o estudo da área da economia. Ele mostra que o impacto econômico longitudinal indica, em média, uma economia de 11 dólares para cada um dólar investido em educação e aprendizagem socioemocional na infância e na adolescência.
Portanto, a importância de aumentar a capacidade dos alunos no longo prazo de lidar com diversas situações e protegê-los de riscos é central no desenho de um programa de habilidades para a vida. Não somente esses indivíduos irão colher os resultados para sua vida, como o país será beneficiado como um todo, como indicam os estudos.

Eu sou Tonia Casarin, mestre em Educação pelo Teachers College Columbia University (NY). Escrevo neste espaço quinzenalmente sobre educação socioemocional e educação integral, assunto fundamental na pauta das escolas e das famílias.

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Educação Socioemocional

A Aprendizagem socioemocional está cada mais presente no ambiente escolar. Nem sempre construída de forma efetiva, mas já reconhecida como um critério fundamental e com impacto direto do desempenho acadêmico dos alunos. Inúmeros são os benefícios da Educação Socioemocional, o mais expressivo com certeza é a melhoria nos índices acadêmicos como afirmam diferentes pesquisas. Outro dado relevante é o desenvolvimento do autocontrole, necessário em uma época onde os noticiários nos mostram o crescimento da violência dos alunos em relação aos educadores. Além de mostrar a redução do conflito entre os alunos e sua interferência na qualidade de vida e saúde mental de todos no ambiente escolar. Porém, existe um fator a longo prazo ainda pouco discutido: o impacto das competências socioemocionais do desenvolvimento econômico. Quer saber mais, a autora Tonia Casarin nos ajuda nessa missão!

O estudo e aplicação do desenvolvimento das competências socioemocionais nas escolas é decorrente de pesquisas acadêmicas em diversas áreas do conhecimento: pedagogia, andragogia, neurociência, psicologia, educação, economia e outras ciências. Além disso, experiências atuais demonstram melhores resultados acadêmicos e sociais para crianças cujas competências socioemocionais foram mais bem desenvolvidas. Obviamente, as competências cognitivas e acadêmicas continuar sendo o cerne da educação, que passa a incorporar, de forma intencional aspectos socioemocionais na educação de alunos.  Um exemplo ocorre quando alunos desenvolvem competências socioemocionais, eles são mais motivados a participar da vida escolar e mais comprometidos.
Como outros resultados desses estudos e experiências, temos conclusões que apontam que o trabalho com as essas competências contribui para a redução do abandono escolar e para a melhoria do desempenho acadêmico, e ainda ressalta a escola como um espaço seguro para estimular o desenvolvimento socioemocional dos alunos, tornando-a central no papel de formação integral dos seus alunos. Conforme o CASEL (The Collaborative for Academic, Social and Emotional Learning), a aprendizagem de habilidades socioemocionais é uma das estratégias mais significativas para promover sucesso acadêmico e reformas escolares eficazes.
Dados mostram que a aprendizagem socioemocional melhora resultados acadêmicos, ajuda alunos a desenvolver autocontrole, melhora as relações da escola com a comunidade, reduz os conflitos entre os alunos e o bullying, ajuda os professores a manter o controle da sala de aula e ajuda os jovens a serem mais saudáveis e bem sucedidos na escola e na vida.

Dentre algumas implicações de pesquisas, uma das mais interessantes sobre crianças que participam de programas de aprendizagem socioemocional em escolas, são os estudos longitudinais, aqueles que acompanham as crianças por longo período de tempo. Esses estudos comprovam impactos em todos os anos escolares, contextos sociais e tipos de escolas.
Os resultados mostram que 23% dos alunos apresentam de melhoria em habilidades socioemocionais, 9% de melhoria em atitudes frente a escola, família e outras pessoas de seu convívio, 9% de melhoria em comportamento social e 11% melhoria em testes acadêmicos. Esses benefícios são  acompanhados de 9% a menos de problemas de comportamento, e 10% de redução em distúrbios emocionais. Além disso, os pesquisadores identificaram a redução de fatores de risco em várias áreas da vida de uma criança, envolvimento em problemas como violência, delinquência, abuso de substâncias químicas ou a reprovação escolar.
Um recente estudo de 2015 da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) faz um panorama entre dezoito países sobre o impacto das competências socioemocionais do desenvolvimento econômico de diferentes populações. As correlações indicam que, em todos os países, habilidades socioemocionais se relacionam com níveis de  renda e desemprego, graduação, obesidade, depressão, problemas de comportamento e conduta, bullying, comportamentos vitimizantes, além de indicadores de qualidades de vida e saúde física.Como outros resultados desses estudos e experiências, temos conclusões que apontam que o trabalho com as essas competências contribui para a redução do abandono escolar e para a melhoria do desempenho acadêmico, e ainda ressalta a escola como um espaço seguro para estimular o desenvolvimento socioemocional dos alunos, tornando-a central no papel de formação integral dos seus alunos. Conforme o CASEL (The Collaborative for Academic, Social and Emotional Learning), a aprendizagem de habilidades socioemocionais é uma das estratégias mais significativas para promover sucesso acadêmico e reformas escolares eficazes.
Dados mostram que a aprendizagem socioemocional melhora resultados acadêmicos, ajuda alunos a desenvolver autocontrole, melhora as relações da escola com a comunidade, reduz os conflitos entre os alunos e o bullying, ajuda os professores a manter o controle da sala de aula e ajuda os jovens a serem mais saudáveis e bem sucedidos na escola e na vida.

Outra argumentação relevante é o estudo da área da economia. Ele mostra que o impacto econômico longitudinal indica, em média, uma economia de 11 dólares para cada um dólar investido em educação e aprendizagem socioemocional na infância e na adolescência.
Portanto, a importância de aumentar a capacidade dos alunos no longo prazo de lidar com diversas situações e protegê-los de riscos é central no desenho de um programa de habilidades para a vida. Não somente esses indivíduos irão colher os resultados para sua vida, como o país será beneficiado como um todo, como indicam os estudos.

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Edição 18 da Educatrix disponível para download!

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Para esta edição, convidamos, você, educador, a participar de um mergulho profundo no tema Projeto de vida. Para nos ajudar nesta missão, convidamos especialistas que embarcaram conosco em busca por respostas sobre como colaborar com a formação dos alunos, sem esquecer da construção dos projetos dos próprios professores.

Esperamos que vocês encontrem ferramentas para que essa grande jornada de conhecimento, se reverbere em ações para aplicarmos em nossas salas de aulas, em nossas comunidades escolares e que, acima de tudo, sigamos construindo, juntos, cada vez mais, uma educação para a vida.

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ESPECIAL Trilhas da BNCC | Ensino de línguas

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Percursos possíveis para trabalhar habilidades e competências exigidas na Base em todos os componentes curriculares.

Texto Educatrix

Conectar as diversas habilidades para desenvolver competências é a base da escola do século XXI. A Base Nacional Comum Curricular que o diga. A proposta de reestruturação das disciplinas como componentes curriculares dentro das áreas do conhecimento (Linguagens, Matemática, Ciências Humanas e Ciências da Natureza) por si só já demonstra o foco do documento em desenvolver, a partir da consolidação das competências específicas de cada área, atitudes que colaboram com a formação integral do aluno.

Apesar de ser algo bastante atraente na teoria, ainda há uma série de dúvidas sobre como estimular as competências no dia a dia em sala de aula. Por isso, convidamos autores de materiais didáticos e especialistas de cada componente curricular das quatro áreas do conhecimento para sugerir como planejar aulas, projetos e reflexões focados na autonomia e no protagonismo das novas gerações. Qual, de fato, é o papel das escolas dentro desse ecossistema vivo que transcende o projeto escolar e forma cidadãos globais?

A BNCC e a língua portuguesa

Um aprendizado baseado nas múltiplas práticas de linguagem.

Texto Moderna

a proposta da bncc para o ensino de Língua Portuguesa não é essencialmente inovadora, pois complementa o que já era proposto pelos Parâmetros Curriculares Nacionais. O componente é abordado sob a perspectiva enunciativo-discursiva de linguagem, cuja adoção implica a compreensão de que um texto não é apenas um conjunto de frases ou de parágrafos organizados para produzir sentido, mas a materialização de determinado uso da língua que ocorre em um contexto social e histórico e sob circunstâncias específicas.

Uma placa com a frase “Silêncio!” em uma parede de hospital, por exemplo, deve ser, sob essa perspectiva, analisada como um discurso, ou seja, como a expressão de uma ordem, produzida com a intenção de orientar o comportamento das pessoas para manter o cuidado com os pacientes. Na bncc, o texto (oral, escrito, multimodal/multissemiótico) torna-se o centro das atividades, implicando um trabalho com a língua não apenas como um código a ser decifrado nem como um mero sistema de regras gramaticais, mas como forma de manifestação da linguagem. A finalidade é fazer com que o ensino de Língua Portuguesa permita o desenvolvimento crítico e reflexivo do aluno como agente da linguagem, capaz de usar a língua e as linguagens em diversificadas atividades humanas.

Com esse objetivo, a bncc propõe práticas de linguagem de diferentes esferas ou campos de atuação: vida cotidiana e pública, artístico-literário, práticas de estudo e pesquisa jornalístico-midiático etc. Tais práticas devem ser norteadas a partir de quatro eixos organizadores:

01 – Oralidade Propõe a produção de textos orais, considerando as diferenças entre língua falada e escrita e as formas específicas de composição do discurso oral, em situações formais ou informais.

02 –  Leitura O foco está na interação ativa entre leitor/ouvinte/espectador com textos escritos, orais ou multissemióticos de diferentes campos. Para aprimorar a compreensão leitora, o professor pode propor diversificadas experiências de ler, ouvir, comentar textos escritos etc. Essas experiências devem incluir a reflexão sobre quem escreveu, para quem, sobre o quê, com que finalidade, em qual tempo e espaço, como o texto circulou etc.

03 – Produção de textos Propõe o engajamento dos alunos em situações reais de produção de textos verbais, não verbais, multimodais/multissemióticos, considerando o uso das linguagens adequado ao contexto de produção, recepção e circulação. Essas oportunidades de produção devem ser uma atividade sociointeracional, produzida a partir do diálogo, seja com um sujeito, seja com outro texto. Esse processo não deve ser uma tarefa burocrática, pois deve ser construído como uma atividade em que os alunos se envolvem com as práticas sociais da linguagem, por meio de planejamento, revisão, reescrita e edição de textos.

04 – Análise linguística / semiótica As habilidades desenvolvidas vinculam-se às práticas propostas nos eixos anteriores. Mantém-se o caminho do uso-reflexão-uso que visa a refletir sobre as possibilidades de uso permitidas pelo sistema da língua, oral ou escrita, e das múltiplas linguagens, e a ser capaz de aplicar o recurso mais adequado ao contexto em que está inserido. Propõe-se um trabalho que leve as crianças à reflexão sobre as diferentes materialidades, responsáveis pelos efeitos de sentido em textos oriundos de diferentes campos de atuação.

A bncc certamente ainda passará por algumas revisões. Afinal, não seria razoável supor que um documento desse porte nascesse pronto e perfeito. A prática em sala de aula certamente será importante fonte de contribuição para tais revisões.

Os desafios para o ensino da língua inglesa

Um exercício de empatia com foco na educação global e para a paz.

Texto Eduardo Amos

montserrat moreno nos ensina que mais difícil do que adquirir novos conhecimentos é conseguir desprender-se dos velhos. A chegada da Base Nacional Comum Curricular (bncc) pode confirmar esse ensinamento, pois significa o início de um dos mais profundos processos de renovação da educação nacional. De maneira geral, muitos professores estão dispostos a encarar os princípios propostos como uma possibilidade de minimizar certas condições que enfrentam atualmente e que são marcadas por indisciplina, violência e desvalorização do aprendizado bem como do próprio professor.

Em uma perspectiva geral, a Base reconhece que a “educação deve afirmar valores e estimular ações que contribuam para a transformação da sociedade, tornando-a mais humana, socialmente justa e, também, voltada para a preservação da natureza” (BNCC, p.8). Nesse sentido, a prática pedagógica tradicional baseada em muitos exercícios gramaticais mecânicos e repetitivos até conseguem produzir um resultado bom em termos de nota, mas jamais irá preparar o aluno para enfrentar os desafios da vida atual. Isso porque a educação tradicional está baseada em modelos do passado que atendem a demandas do passado. Hoje, o mundo e as relações humanas estão muito mais complexos e desafiadores, exigindo o desenvolvimento das competências socioemocionais, uma vez que, por meio desse processo se aprende a reconhecer, nomear e controlar emoções, demonstrar empatia, estabelecer relações sociais pautadas pela civilidade, se colocar no lugar do outro e tomar decisões de maneira responsável.

Soma-se a isso a farta documentação acerca do caráter violento do ambiente escolar, o que exige estratégias e abordagens que trabalhem questões como a resolução não violenta de conflitos, o acolhimento às diferenças, o saber conviver.

Diante desse cenário, dentre as dez competências gerais que devem permear transversalmente as disciplinas, chamamos a atenção para a de número 9, que propõe: “Exercitar a empatia, o diálogo, a resolução de conflitos e a cooperação, fazendo-se respeitar e promovendo o respeito ao outro e aos direitos humanos, com acolhimento e valorização da diversidade de indivíduos e de grupos sociais, seus saberes, identidades, culturas e potencialidades, sem preconceitos de qualquer natureza.” (bncc, p. 10).

Essa competência traz para a prática educacional questões altamente relevantes ligadas à Educação para a Paz. E, nessa perspectiva, os esforços pedagógicos para cultivar essas atitudes trarão benefícios à toda comunidade escolar. No entanto, a implementação da BNCC não pode estar apenas nas mãos dos professores. Esse processo deverá ser o resultado do esforço coletivo ou simplesmente nada acontecerá. E nossos jovens têm pressa. Ao contrário do que possamos imaginar, para eles, o futuro já começou. Para eles, o futuro é hoje!

Eduardo Amos

é autor de livros didáticos e paradidáticos há mais de 38 anos. Sua obra Students for Peace recebeu o prêmio ELTons 2017, concedido pelo Conselho Britânico em Londres na categoria Excelência em Inovação em Livros Didáticos para o Ensino de Língua Inglesa. É membro do GEEPAZ – Grupo de Estudos de Educação para Paz e Tolerância do Laboratório de Psicologia Genética da Faculdade de Educação da UNICAMP. Nos últimos anos tem trabalhado também na área de consultoria para instituições escolares na área de Educação para a Paz.

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10 passos para montar um plano de contingência

10 passos para montar um plano de contingência

O que você deve considerar na hora de estruturar aulas on-line e à distância para a educação básica. O anúncio da suspensão das aulas por conta da pandemia do coronavírus (COVID-19) deixa toda a sociedade preocupada em relação ao futuro dos nossos estudantes e, claro, em relação aos prejuízos de aprendizagem. Mais rápido do que imaginávamos, gestores públicos, organizações da sociedade civil e comunidade de profissionais em educação trouxeram a primeira resposta ao fechamento das escolas: o uso das tecnologias digitais. A velocidade em propor que a tecnologia nos ajude em cenários de fechamento de escolas tem a ver, também, com a experiência de outros países onde a pandemia chegou primeiro, ainda como epidemia, como China, Itália e Coreia do Sul. Eu não agi de forma diferente e a primeira coisa que comecei a fazer foi colecionar links de referência com recomendações, relatos de experiências e análises dos impactos da educação online em inglês, português e espanhol. As redes profissionais das quais faço parte também foram importantes para apoiar a construção de algo inédito para a grande maioria de todos nós: planos de educação online e à distância para educação básica. Compartilho aqui 10 passos que estamos construindo juntos para lidar com esta situação tão delicada:

Atenção às políticas públicas e anúncios oficiais

Por mais que campanhas de autoisolamento estejam sendo amplamente disseminadas e recomendadas como ação de responsabilidade individual, a decisão de fechamento de escolas passa, necessariamente, pelo poder público. Redes estaduais e municipais estão divulgando regularmente suas medidas e precisamos ficar atentos às diretrizes diariamente. Um ponto importante a ser observado é se as diretrizes de fechamento vêm acompanhadas de clareza sobre a formalidade do cumprimento dos dias letivos. Esta definição é de suma importância para desenhar nossos planos, pois a obrigatoriedade do cumprimento de dias letivos utilizando tecnologias é muito diferente de manter os estudantes ativos e abastecidos de recomendações de atividades que podem ser realizadas online em período de férias, por exemplo.

Um plano de contingência é um plano mesmo

 

Mesmo um cenário de tanta volatilidade e mudança rápida de decisões não nos desobriga de ter um plano. Sair fazendo coisas sem minimamente pensar, refletir e pactuar com o máximo possível de representantes da comunidade escolar é atropelar as pessoas, processos e causar transtornos maiores do que podemos imaginar. Não teremos um mês para fazer um plano, talvez tenhamos um dia, no máximo uma semana, mas precisamos dele.

Comece já. Em se tratando de plano de tecnologia na educação, o modelo com o qual mais identifico é o do CIEB (Centro de Inovação para Educação Brasileira). O conceito das quatro dimensões nos ajuda a organizar a implementação de planos de tecnologia em quatro frentes concomitantes e integradas: visão, competências, recursos educacionais digitais e infraestrutura (saiba mais sobre elas no Guia Tecnologia na Educação do Porvir). Ao entender esses quatro elementos você terá um panorama do que seja possível fazer

Não é só fazer aulas remotas de casa

 
 

A experiência escolar é algo insubstituível. Talvez seja uma das experiências humanas mais sociais. Fechar escolas e desenhar plano de atividades para crianças e professores à distância é, portanto, algo completamente diferente de planejar atividades escolares presenciais. Sendo assim, seja modesto, por mais que cada dimensão esteja super bem atendida. Comece pequeno e teste antes se a escola ainda estiver aberta. Se o seu turno escolar é de quatro horas, por exemplo, não tente ficar conectado pelo mesmo tempo de forma ininterrupta como na escola. Programe uma atividade por dia com bastante intencionalidade, deixe as regras claras e vá aumentando a carga horária gradativamente conforme perceber o amadurecimento da turma.

Não podemos deixar ninguém para trás

Uma das principais preocupações em torno de aulas online tem a ver com equidade e qualidade. Mais uma vez o episódio do coronavírus escancara nossa colossal desigualdade social. Já sabemos que muitas escolas terão muito mais condições de suportar experiências digitais do que outras, mas nem por isso não podemos pensar em estratégias para tentar diminuir diferenças. Verifique se todos os professores têm dispositivos para utilizar em casa, caso contrário, é possível que a escola empreste os equipamentos? E no caso dos estudantes, é possível que eles levem os equipamentos da escola para casa em regime de empréstimo?

Estabeleça parceria com as famílias

É preciso uma aldeia inteira para educar uma criança. Quem nunca ouviu essa expressão? Educação não é dever só da escola. Famílias e outras instituições precisam se comprometer nesse processo. Os responsáveis pelas crianças serão pessoas fundamentais nesse processo, por isso será necessário envolvê-los desde o começo. Comece atualizando os contatos de pais e responsáveis. Nesse cenário, será essencial manter uma comunicação clara, transparente e ágil com os responsáveis. Se possível, faça uma pesquisa com as famílias e mapeie endereços, telefones, e-mails, contatos de mensagens instantâneas. Em seguida, comunique seu plano antes de começar. Tente envolver as famílias nas rotinas estabelecidas no plano e pactuar com eles quais delas poderão contar com a participação das famílias para serem cumpridas.

Cuide das especificidades de cada segmento e necessidade

Tecnologia não funciona da mesma forma para todas as faixas etárias. Não faz sentido aulas online para educação infantil, assim como também jovens de ensino médio não precisam de acompanhamento das famílias para realizar atividades online. Utilize tecnologia de acordo com cada segmento para fortalecer o trabalho pedagógico de acordo com as necessidades de desenvolvimento de cada idade. Também não podemos esquecer da inclusão de estudantes com qualquer tipo de deficiência física ou intelectual.

Segurança de todos

Desde que começamos a falar de uso de tecnologias na educação, a questão da segurança digital vem sendo levantada como uma das partes mais esquecidas no contexto de integração. Em um cenário de uso de tecnologias digitais para aprendizagem em casa, nossa atenção deve se redobrar. Há que se observar questões como: tempo de exposição à tela, navegação assistida, requisitos de privacidade e proteção de dados.

Saúde mental de professores e gestores

Uma das grandes questões atuais em educação diz respeito à saúde emocional dos educadores e profissionais de educação. Assim como precisamos cuidar da saúde emocional das crianças, vamos precisar cuidar muito bem de professores e gestores nesse período. Há relatos de extrema exaustão entre os profissionais de outros países que passaram por este período de rápida adaptação. Uma dica importante é não exigir que professores estejam conectados por muito tempo ou com grande parte de atividades síncronas, nem para atividades profissionais e nem em navegação especulativa. É preciso estabelecer horários de atendimentos e respeitá-los. Os professores não podem ficar à disposição de estudantes o tempo todo.

Em tempos de crise, ficamos com fome de novas notícias e atualizações. Recebemos uma enxurrada de notícias e informações e precisamos de muito cuidado para checar se não estamos fazendo parte de uma onda de desinformação. Uma orientação importante é fazer uma navegação com roteiro e outra que priorize a família, a ciência e a arte. Estabeleça um roteiro e não se perca no oceano da internet. Se quiser saber notícias de entes queridos, vá direto às mensagens pessoais. Para se manter informado, vá direto nos canais oficiais como sites e aplicativos de jornais respeitados e do aplicativo criado pelo Ministério da Saúde. Alimente-se com arte e poesia, leia livros que estavam na sua lista, visite museus virtuais, ouça suas músicas preferidas e invista tempo em atividades que exigem aprofundamento como, por exemplo, meditar e escrever um diário. Como o plano de fechamento é generalizado, será possível que, além das rotinas escolares, você também esteja responsável por familiares, portanto, é importante se cuidar.

Por fim, crie uma rotina de cuidado compartilhado. Faça conferências regulares e coloque o assunto da saúde emocional na pauta para falar sobre como está sendo o processo para todos os envolvidos.

Precisamos falar sobre a morte

Parte da série de conteúdos que foram publicados sobre o tema tem a ver com a própria abordagem educativa em torno da pandemia e suas causas, incluindo as mortes. É possível que percamos familiares, sobretudo, pessoas idosas que estão sendo as mais atingidas nesse momento. Como lidar com essa faceta da crise com os estudantes? E se durante esse processo algum familiar dos estudantes vier a falecer? Como incluir esse assunto nas atividades online?

Por uma pedagogia da contingência

Não teremos controle do nosso plano, vamos iniciar, trabalhar, testar, refinar e recomeçar. Indiscutivelmente teremos perdas. É bom começar com essa noção, que ao meu ver, não é pessimista. Uma estratégia importante dessa atuação pedagógica, talvez seja a do registro e da documentação. Um dos recursos mais importantes da tecnologia para a educação, talvez seja a potência de criar registros que nos serão importantes para transformar esta fase difícil em narrativas de vidas, em histórias de enfrentamentos e em sistematizações de algo que nunca fizemos antes e que resultarão em aprendizados importantes para o futuro da educação. Os registros são estratégias importantes para os estudantes também, portanto encoraje que esta seja uma tarefa regular e sistemática. Será importante para retomar o fio da meada quando as aulas recomeçarem. Começar sabendo que coisas podem dar errado nos retira a obrigação de acertar em tudo e nos abre um campo humano seguro para fazer o melhor que podemos exatamente onde estamos, com o que somos, com o que temos e com o que podemos. Vamos em frente.

Comece já. Em se tratando de plano de tecnologia na educação, o modelo com o qual mais identifico é o do CIEB (Centro de Inovação para Educação Brasileira). O conceito das quatro dimensões nos ajuda a organizar a implementação de planos de tecnologia em quatro frentes concomitantes e integradas: visão, competências, recursos educacionais digitais e infraestrutura (saiba mais sobre elas no Guia Tecnologia na Educação do Porvir). Ao entender esses quatro elementos você terá um panorama do que seja possível fazer

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10 passos para montar um plano de contingência

O que você deve considerar na hora de estruturar aulas on-line e à distância para a educação básica. O anúncio da suspensão das aulas por conta da pandemia do coronavírus (COVID-19) deixa toda a sociedade preocupada em relação ao futuro dos nossos estudantes e, claro, em relação aos prejuízos de aprendizagem. Mais rápido do que imaginávamos, gestores públicos, organizações da sociedade civil e comunidade de profissionais em educação trouxeram a primeira resposta ao fechamento das escolas: o uso das tecnologias digitais. A velocidade em propor que a tecnologia nos ajude em cenários de fechamento de escolas tem a ver, também, com a experiência de outros países onde a pandemia chegou primeiro, ainda como epidemia, como China, Itália e Coreia do Sul. Eu não agi de forma diferente e a primeira coisa que comecei a fazer foi colecionar links de referência com recomendações, relatos de experiências e análises dos impactos da educação online em inglês, português e espanhol. As redes profissionais das quais faço parte também foram importantes para apoiar a construção de algo inédito para a grande maioria de todos nós: planos de educação online e à distância para educação básica. Compartilho aqui 10 passos que estamos construindo juntos para lidar com esta situação tão delicada:

Atenção às políticas públicas e anúncios oficiais

Por mais que campanhas de autoisolamento estejam sendo amplamente disseminadas e recomendadas como ação de responsabilidade individual, a decisão de fechamento de escolas passa, necessariamente, pelo poder público. Redes estaduais e municipais estão divulgando regularmente suas medidas e precisamos ficar atentos às diretrizes diariamente. Um ponto importante a ser observado é se as diretrizes de fechamento vêm acompanhadas de clareza sobre a formalidade do cumprimento dos dias letivos. Esta definição é de suma importância para desenhar nossos planos, pois a obrigatoriedade do cumprimento de dias letivos utilizando tecnologias é muito diferente de manter os estudantes ativos e abastecidos de recomendações de atividades que podem ser realizadas online em período de férias, por exemplo.

Um plano de contingência é um plano mesmo

 

Mesmo um cenário de tanta volatilidade e mudança rápida de decisões não nos desobriga de ter um plano. Sair fazendo coisas sem minimamente pensar, refletir e pactuar com o máximo possível de representantes da comunidade escolar é atropelar as pessoas, processos e causar transtornos maiores do que podemos imaginar. Não teremos um mês para fazer um plano, talvez tenhamos um dia, no máximo uma semana, mas precisamos dele.

Comece já. Em se tratando de plano de tecnologia na educação, o modelo com o qual mais identifico é o do CIEB (Centro de Inovação para Educação Brasileira). O conceito das quatro dimensões nos ajuda a organizar a implementação de planos de tecnologia em quatro frentes concomitantes e integradas: visão, competências, recursos educacionais digitais e infraestrutura (saiba mais sobre elas no Guia Tecnologia na Educação do Porvir). Ao entender esses quatro elementos você terá um panorama do que seja possível fazer

Não é só fazer aulas remotas de casa

 
 

A experiência escolar é algo insubstituível. Talvez seja uma das experiências humanas mais sociais. Fechar escolas e desenhar plano de atividades para crianças e professores à distância é, portanto, algo completamente diferente de planejar atividades escolares presenciais. Sendo assim, seja modesto, por mais que cada dimensão esteja super bem atendida. Comece pequeno e teste antes se a escola ainda estiver aberta. Se o seu turno escolar é de quatro horas, por exemplo, não tente ficar conectado pelo mesmo tempo de forma ininterrupta como na escola. Programe uma atividade por dia com bastante intencionalidade, deixe as regras claras e vá aumentando a carga horária gradativamente conforme perceber o amadurecimento da turma.

Não podemos deixar ninguém para trás

Uma das principais preocupações em torno de aulas online tem a ver com equidade e qualidade. Mais uma vez o episódio do coronavírus escancara nossa colossal desigualdade social. Já sabemos que muitas escolas terão muito mais condições de suportar experiências digitais do que outras, mas nem por isso não podemos pensar em estratégias para tentar diminuir diferenças. Verifique se todos os professores têm dispositivos para utilizar em casa, caso contrário, é possível que a escola empreste os equipamentos? E no caso dos estudantes, é possível que eles levem os equipamentos da escola para casa em regime de empréstimo?

Estabeleça parceria com as famílias

É preciso uma aldeia inteira para educar uma criança. Quem nunca ouviu essa expressão? Educação não é dever só da escola. Famílias e outras instituições precisam se comprometer nesse processo. Os responsáveis pelas crianças serão pessoas fundamentais nesse processo, por isso será necessário envolvê-los desde o começo. Comece atualizando os contatos de pais e responsáveis. Nesse cenário, será essencial manter uma comunicação clara, transparente e ágil com os responsáveis. Se possível, faça uma pesquisa com as famílias e mapeie endereços, telefones, e-mails, contatos de mensagens instantâneas. Em seguida, comunique seu plano antes de começar. Tente envolver as famílias nas rotinas estabelecidas no plano e pactuar com eles quais delas poderão contar com a participação das famílias para serem cumpridas.

Cuide das especificidades de cada segmento e necessidade

Tecnologia não funciona da mesma forma para todas as faixas etárias. Não faz sentido aulas online para educação infantil, assim como também jovens de ensino médio não precisam de acompanhamento das famílias para realizar atividades online. Utilize tecnologia de acordo com cada segmento para fortalecer o trabalho pedagógico de acordo com as necessidades de desenvolvimento de cada idade. Também não podemos esquecer da inclusão de estudantes com qualquer tipo de deficiência física ou intelectual.

Segurança de todos

Desde que começamos a falar de uso de tecnologias na educação, a questão da segurança digital vem sendo levantada como uma das partes mais esquecidas no contexto de integração. Em um cenário de uso de tecnologias digitais para aprendizagem em casa, nossa atenção deve se redobrar. Há que se observar questões como: tempo de exposição à tela, navegação assistida, requisitos de privacidade e proteção de dados.

Saúde mental de professores e gestores

Uma das grandes questões atuais em educação diz respeito à saúde emocional dos educadores e profissionais de educação. Assim como precisamos cuidar da saúde emocional das crianças, vamos precisar cuidar muito bem de professores e gestores nesse período. Há relatos de extrema exaustão entre os profissionais de outros países que passaram por este período de rápida adaptação. Uma dica importante é não exigir que professores estejam conectados por muito tempo ou com grande parte de atividades síncronas, nem para atividades profissionais e nem em navegação especulativa. É preciso estabelecer horários de atendimentos e respeitá-los. Os professores não podem ficar à disposição de estudantes o tempo todo.

Em tempos de crise, ficamos com fome de novas notícias e atualizações. Recebemos uma enxurrada de notícias e informações e precisamos de muito cuidado para checar se não estamos fazendo parte de uma onda de desinformação. Uma orientação importante é fazer uma navegação com roteiro e outra que priorize a família, a ciência e a arte. Estabeleça um roteiro e não se perca no oceano da internet. Se quiser saber notícias de entes queridos, vá direto às mensagens pessoais. Para se manter informado, vá direto nos canais oficiais como sites e aplicativos de jornais respeitados e do aplicativo criado pelo Ministério da Saúde. Alimente-se com arte e poesia, leia livros que estavam na sua lista, visite museus virtuais, ouça suas músicas preferidas e invista tempo em atividades que exigem aprofundamento como, por exemplo, meditar e escrever um diário. Como o plano de fechamento é generalizado, será possível que, além das rotinas escolares, você também esteja responsável por familiares, portanto, é importante se cuidar.

Por fim, crie uma rotina de cuidado compartilhado. Faça conferências regulares e coloque o assunto da saúde emocional na pauta para falar sobre como está sendo o processo para todos os envolvidos.

Precisamos falar sobre a morte

Parte da série de conteúdos que foram publicados sobre o tema tem a ver com a própria abordagem educativa em torno da pandemia e suas causas, incluindo as mortes. É possível que percamos familiares, sobretudo, pessoas idosas que estão sendo as mais atingidas nesse momento. Como lidar com essa faceta da crise com os estudantes? E se durante esse processo algum familiar dos estudantes vier a falecer? Como incluir esse assunto nas atividades online?

Por uma pedagogia da contingência

Não teremos controle do nosso plano, vamos iniciar, trabalhar, testar, refinar e recomeçar. Indiscutivelmente teremos perdas. É bom começar com essa noção, que ao meu ver, não é pessimista. Uma estratégia importante dessa atuação pedagógica, talvez seja a do registro e da documentação. Um dos recursos mais importantes da tecnologia para a educação, talvez seja a potência de criar registros que nos serão importantes para transformar esta fase difícil em narrativas de vidas, em histórias de enfrentamentos e em sistematizações de algo que nunca fizemos antes e que resultarão em aprendizados importantes para o futuro da educação. Os registros são estratégias importantes para os estudantes também, portanto encoraje que esta seja uma tarefa regular e sistemática. Será importante para retomar o fio da meada quando as aulas recomeçarem. Começar sabendo que coisas podem dar errado nos retira a obrigação de acertar em tudo e nos abre um campo humano seguro para fazer o melhor que podemos exatamente onde estamos, com o que somos, com o que temos e com o que podemos. Vamos em frente.

Comece já. Em se tratando de plano de tecnologia na educação, o modelo com o qual mais identifico é o do CIEB (Centro de Inovação para Educação Brasileira). O conceito das quatro dimensões nos ajuda a organizar a implementação de planos de tecnologia em quatro frentes concomitantes e integradas: visão, competências, recursos educacionais digitais e infraestrutura (saiba mais sobre elas no Guia Tecnologia na Educação do Porvir). Ao entender esses quatro elementos você terá um panorama do que seja possível fazer

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BNCC no Ensino Médio: o que esperar?

BNCC no Ensino Médio: o que esperar?

Um mergulho nas áreas de Linguagem e Matemática para compreender caminhos que se abrem às escolas.

A base nacional comum curricular para o Ensino Médio determina os componentes curriculares de Língua Portuguesa e Matemática como obrigatórios para os três anos do segmento. Assim, as disciplinas ganharam mais horas de formação e diretrizes específicas de competências e habilidades que devem ser desenvolvidas. Nesta edição, convidamos autores de Língua Portuguesa e de Matemática para dar um parecer sobre os caminhos para o trabalho com habilidades e competências socioemocionais de maneira integrada, colaborativa, criativa e formativa no Ensino Médio.

O novo Ensino Médio e a resolução de problemas

Foco no desenvolvimento de pensamentos e competências matemáticas para toda a vida.

Texto: Fabio Martins de Leonardo

Os resultados que os estudantes brasileiros vêm apresentando em avaliações nacionais e internacionais refletem, em parte, o fracasso do Ensino Médio no Brasil. Os altos índices de evasão escolar contribuem, ainda, para que este seja considerado o gargalo da nossa Educação Básica. Segundo o censo da Educação Básica publicado pelo Inep em 2019, mais de um terço dos brasileiros de 25 a 34 anos não concluiu o Ensino Médio. Dos cerca de três milhões que ingressaram nessa etapa, aproximadamente 700 mil não chegaram ao último ano.

Os números ilustram uma realidade existente há tempos nas escolas brasileiras e levam a uma reflexão sobre a distância do Ensino Médio — que se concretiza muitas vezes por meio de abordagens pedagógicas afastadas das culturas juvenis, do mundo do trabalho e das dinâmicas e questões sociais contemporâneas — em relação às expectativas dos jovens que se preparam para o mercado de trabalho.

A reforma do Ensino Médio pode ser vista como uma tentativa de atrair os jovens para a escola, pois prevê a substituição do modelo único de currículo por um modelo composto da Formação Geral Básica, que abrange as competências e habilidades das áreas de conhecimento previstas na BNCC, e por Itinerários Formativos, organizados por meio de diferentes arranjos curriculares, conforme a relevância para o contexto local e a possibilidade dos sistemas de ensino. Esse modelo adota a flexibilidade como princípio de organização e busca atender à multiplicidade de interesses dos estudantes.

Em paralelo, há a preocupação em se garantir aos jovens as aprendizagens necessárias para atuar em uma sociedade em constante mudança e prepará-los para profissões e tecnologias que ainda serão inventadas e para resolver problemas variados. Nesse sentido, a BNCC ressalta a importância de se trabalhar o pensamento computacional, o que envolve as capacidades de compreender, analisar, definir, modelar, resolver, comparar e automatizar problemas e suas soluções, de forma metódica e sistemática, por meio do desenvolvimento de algoritmos.

O pensamento computacional pode ser entendido como processo de resolução de problemas. Segundo José Armando Valente, trata-se da “formulação de problemas de uma forma que permita usar um computador e outras ferramentas para ajudar a resolvê-los; organização lógica e análise de dados; representação de dados através de abstrações como modelos e simulações; automação de soluções através do pensamento algorítmico (a série de passos ordenados); identificação, análise e implementação de soluções possíveis com o objetivo de alcançar a mais eficiente e efetiva combinação de etapas e recursos; e generalização e transferência desse processo de resolução de problemas para uma ampla variedade de problemas”.

Observando as habilidades da Matemática e suas Tecnologias previstas na BNCC para o Ensino Médio, nota-se que muitas trabalham a resolução de problemas:

  • (em13mat306) Resolver e elaborar problemas em contextos que envolvem fenômenos periódicos reais, como ondas sonoras, ciclos menstruais, movimentos cíclicos, entre outros, e comparar suas representações com as funções seno e cosseno, no plano cartesiano, com ou sem apoio de aplicativos de álgebra e geometria.
  • (em13mat315) Investigar e registrar, por meio de um fluxograma, quando possível, um algoritmo que resolve um problema.
  • (em13mat406) Utilizar os conceitos básicos de uma linguagem de programação na implementação de algoritmos escritos em linguagem corrente e/ou matemática.

Assim, espera-se que os estudantes não apenas “resolvam”, mas “resolvam e elaborem problemas”. Espera-se que identifiquem ou construam um modelo para gerar respostas adequadas, analisar os fundamentos e as propriedades de modelos existentes, avaliando seu alcance e validade para o problema em foco e até a possibilidade de transferência desse modelo para a resolução de problemas similares. Espera-se que investiguem e utilizem os conceitos estudados.

Apesar de comumente associado à Matemática, o pensamento computacional não se restringe a ela. Ele permite trabalhar a capacidade de raciocinar logicamente, formular e testar conjecturas, avaliar a validade de raciocínios e construir argumentações – capacidades importantes para diversos aspectos do cotidiano e, portanto, objeto de trabalho nas diversas áreas do conhecimento. Uma das novidades trazidas pela BNCC está, justamente, em propor que o trabalho com essas capacidades esteja presente nas diferentes áreas do conhecimento.

Com as expectativas que se colocam sobre a reforma do Ensino Médio, surgem os desafios de sua implementação, entre eles a flexibilização curricular e a transposição das barreiras disciplinares para o trabalho com temáticas que permeiam as várias áreas do conhecimento, como o pensamento computacional.

Fabio Martins de Leonardo

é licenciado em matemática pela USP e editor executivo de Matemática da Editora Moderna.

Para saber mais

  • Valente, J. A. Integração do pensamento computacional no currículo da educação básica: diferentes estratégias usadas e questões de formação de professores e avaliação do aluno. Revista e-Curriculum. 2016, 14(3), 864-897. Disponível em: mod.lk/ed18linh. Acesso em: 10 fev. 2020.

O novo Ensino Médio e a produção de sentidos

Trabalho em área: a integração em favor do desenvolvimento de competências e habilidades.

Texto: Marisa Balthasar e Shirley Goulart

Dentre as mudanças esperadas para o Novo Ensino Médio, os currículos precisarão garantir os direitos comuns de aprendizagem, nas diferentes áreas do conhecimento*, indicados pela BNCC. Eles configuram uma formação integral dos jovens, com desenvolvimento articulado de competências e habilidades cognitivas e socioemocionais.

Essa formação deverá promover ampliação da participação cidadã, ética e crítica; protagonismo em projetos de vida, com realizações pessoais e coletivas, maior autonomia nos estudos e escolhas para a inserção no mundo do trabalho.

Em vez das sequências de conteúdos disciplinares, os currículos oferecerão situações significativas de aprendizagem para o exercício e o aprimoramento de um conjunto de competências/habilidades, com mobilização de conhecimentos de diferentes ordens: conteúdos, conceitos, procedimentos e processos, atitudes e valores – os objetos de conhecimento.

A Lei n. 13.415/2017 determina as áreas do conhecimento em Ciências Humanas e Sociais Aplicadas; Ciências da Natureza; Linguagens e Matemática. A Lei traz flexibilidade para a arquitetura curricular das redes, mas fixa a obrigatoriedade do ensino de Língua Portuguesa e de Matemática em todos os anos do Ensino Médio. Assim, Língua Portuguesa tanto integra Linguagens, no desenvolvimento de competências e habilidades da área, como responde pelo desenvolvimento de outras mais específicas às práticas de linguagem com língua materna, como as que interessam para a formação do leitor literário ou para o uso reflexivo da argumentação, nas situações orais e multissemióticas em que predomina o argumentar.  *Lei n. 13.415/2017: as áreas do conhecimento”

Habilidade (em13lgg301) Participar de processos de produção individual e colaborativa em diferentes linguagens (artísticas, corporais e verbais), levando em conta suas formas e seus funcionamentos, para produzir sentidos em diferentes contextos.”

Em Linguagens e suas Tecnologias, a BNCC indica que no Ensino Médio deve-se retomar e aprofundar objetos de conhecimento da etapa anterior em favor de habilidades que, em progressão curricular, tornam-se mais complexas pelas ações cognitivas que demandam (interpretar, argumentar, avaliar, estabelecer relações etc.) e pelas práticas de linguagens dos diferentes campos de atuação que as mobilizam, exigindo usos mais críticos, reflexivos, autorais e colaborativos de linguagens, mídias e suas combinações. Espera-se mais autonomia dos estudantes como sujeitos dessas práticas, em especial nas das culturas juvenis, dos novos e dos multiletramentos. 

Quando alinhadas aos pressupostos da área (linguagens como interação; centralidade dos jovens como sujeitos das práticas; usos como base para reflexão, análise e novos usos) e focadas no desenvolvimento de habilidades/competências, as práticas dos diferentes componentes integram-se como práticas de área.

O que se espera no trabalho de Artes, Educação Física, Inglês e Língua Portuguesa é uma integração de “alicerce”, isto é, orientada por uma concepção teórico-metodológica da área e por isso nem sempre os componentes precisarão ter atividades “casadas”, o que acontecia em propostas interdisciplinares frágeis, em que cada componente respondia por uma ação isolada.

Na abordagem em área, para desenvolver a habilidade EM13lgg301, por exemplo, Educação Física poderá propor a experimentação de práticas corporais de diferentes matrizes culturais, problematizando e materializando o respeito ao outro, a colaboração, com inclusão. Arte poderá trabalhar a apreciação e criação com dança, teatro, música, artes visuais e/ou suas combinações, com mobilização de conhecimentos sobre as linguagens artísticas; escolhas, tomada de decisões, considerando intencionalidades e contextos culturais. Já em Língua Portuguesa e Língua Inglesa, processos de produção de textos e atos de linguagem, de autoria individual e coletiva, com mobilização de conhecimentos de recursos linguísticos e multissemióticos, reflexão sobre intencionalidades e efeitos de sentidos.

Assim, o desenvolvimento dessa habilidade pode ocorrer em variadas propostas de autoria coletiva e colaborativa, em atividades dos componentes ou em projetos e ações da área, articulando dimensões relevantes para a formação integral, como escuta interessada, empatia, diálogo em favor de deliberações e consensos, nas diferentes propostas de experimentação, criação e produção com as linguagens artísticas, corporais e verbais.

Observe-se que isso implica procedimentos comuns à área: definição e análise de contextos de produção, circulação e recepção de textos e atos de linguagem, reflexão sobre intencionalidades e valores, processos de criação, experimentação e produção de textos e atos de linguagem, problematização de escolhas de recursos das linguagens e possibilidades de sentidos.

Muitos poderão ser os caminhos para que a área configure a escola como espaço de vivência autoral, criativa, colaborativa, crítica, ética e poética das linguagens: oficinas de criação, coletivos de poesia e arte, manutenção de blogs literários ou revistas digitais, projetos de investigação, de pesquisa…  E as escolhas devem ser conectadas com expectativas, demandas, interesses juvenis, com foco nas competências/habilidades que os estudantes precisam desenvolver até o fim do Ensino Médio. Vale observar que uma prática pode favorecer várias habilidades, a depender de como é planejada, estruturada e mediada como situação didática.

Marisa Balthasar e Shirley Goulart

são autoras da coleção Singular & Plural, da Moderna.

Para saber mais

  • Ferramenta Base Nacional Comum Curricular Comentada – Linguagens, Instituto Reúna. Disponível em: mod.lk/linha18. Acesso em: 10 fev. 2020.

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Especial Trilhas da BNCC | O ensino de Arte

Especial Trilhas da BNCC | O ensino de Arte

Oportunidades que vão muito além do componente curricular.

A beautiful young girl smiles into the camera as she paints a picture in this art class portrait. Others around her are concentrating on their own artwork.
A beautiful young girl smiles into the camera as she paints a picture in this art class portrait. Others around her are concentrating on their own artwork.

A presença da Arte como um dos componentes curriculares da área de Linguagens no Ensino Fundamental, como se apresenta na Base Nacional Comum Curricular, foi desde a primeira versão pública do documento uma questão avaliada como um retrocesso pelos pesquisadores e professores do campo do ensino e aprendizagem das artes. A delimitação e caracterização do campo de conhecimento como disciplina Arte, nos Parâmetros Curriculares Nacionais de 1997 foi uma conquista hoje desconsiderada na estrutura da Base: de uma disciplina em pé de igualdade com as demais, a Arte passou a integrar uma área como um componente curricular.

Essa situação, por um lado, revela a fragilidade de um campo de conhecimento que nos últimos 50 anos vem tentando se afirmar e se qualificar no contexto escolar: da Educação Artística à Arte, de atividades de livre expressão à leitura de obras e produções contextualizadas. Temos um passado complexo que mesmo antes já transitava entre modelos tradicionais de cópias e repetições, acompanhando o próprio campo das produções artísticas e suas tendências.

Colocar a Arte em uma grade curricular não é tarefa fácil, pois estamos diante de um campo de conhecimento eminentemente caracterizado por invenções e criações nos contextos históricos, culturais e sociais. A Arte como componente curricular na BNCC se apresenta de forma pouco definida, há indicação de algumas competências e habilidades, porém não são estabelecidos claramente os objetos de conhecimento. Entretanto, pode-se lidar com o documento de forma proveitosa, abrindo ao professor a possibilidade de construção de percursos curriculares mais autorais e circunstanciados.

Importante destacar que na Base se mantém as especificidades das quatro linguagens: Artes Visuais, Música, Teatro e Dança. Apesar de não trazer uma discussão explícita sobre as formações iniciais específicas de professores e professoras e suas responsabilidades diante dos conhecimentos de cada uma das linguagens, pode-se aferir pela constante demarcação dos territórios de cada uma delas, que as responsabilidades devem ser respeitadas. O professor formado em Artes Visuais deve se ocupar primordialmente de trabalhar com seu campo de conhecimento, assim como os formados em Música, Teatro e Dança. Este entendimento é reforçado, sobretudo, quando compreendemos o que se define como Artes Integradas no âmbito do documento. Como uma das unidades temáticas, as Artes Integradas visam a explorar as relações e articulações entre as diferentes linguagens e suas práticas, ou seja, as hibridizações entre linguagens que o próprio campo das produções artísticas produz, incluindo-se também as integrações possibilitadas pelas novas tecnologias.

As compreensões e interpretações de um documento curricular podem ser diversas; porém, Artes Integradas não deve ser confundida com a ideia de um professor de artes polivalente, aquele que teria como obrigação trabalhar superficialmente com todas as quatro linguagens. No contexto da bncc, é uma unidade temática suplementar, que vem revelar as complexidades do campo.

A ideia de integração pode se estender para o entendimento de um currículo integrado, que possibilite integrar a Arte aos demais componentes curriculares. Por exemplo, uma proposta curricular que se paute em questões contemporâneas que atravessem as disciplinas, que ativem diversos conhecimentos e mobilizem o interesse dos estudantes pela pesquisa. A pesquisa como modo de conhecer, de viver experiências e de as tornar significativas de forma individual e coletiva. A Arte pode ser vista como um campo de conhecimento integrado e por esta via se destacar no currículo escolar.

Rejane Galvão Coutinho

é mestre e doutora em Artes pela USP e professora do Instituto de Artes da UNESP no curso de Artes Visuais Bacharelado e Licenciatura e no Programa de Pós-Graduação em Artes. É coordenadora do Mestrado Profissional em Artes – Profartes – do IA/Unesp. Tem artigos publicados em periódicos e livros sobre história do ensino de artes no Brasil, formação de educadores mediadores e a educação em museus.

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Todos transformadores

Todos transformadores

O empreendedorismo social colabora para a formação de jovens protagonistas na renovação e atualização do mundo.

O mundo hoje está em constante e acelerada transformação. Por um lado, está cada dia mais evidente a nossa profunda interdependência. Por outro, as revoluções tecnológicas e das comunicações afetam, como nunca, todas as dimensões de nossas vidas. São os jovens, em especial, que enfrentam o maior desafio face a essas mudanças, pois devem projetar suas vidas justamente nesse momento de transição.

Como podem encontrar soluções para um mundo que parece avançar mais rápido do que a nossa capacidade de responder ao que ele nos demanda? O jeito é fazer com que a quantidade de soluções exceda a quantidade de problemas e isso só é possível se todos nós formos sujeitos de transformação social positiva. Isso significa que precisamos desafiar o paradigma atual que ainda prepara as novas gerações para um mundo hierárquico, vertical, cindido em áreas e departamentos do saber e do fazer e orientado para a satisfação dos desejos e das necessidades individuais imediatos por meio da eficiência na repetição.

É face a essa virada civilizatória que o empreendedorismo social – um campo em construção nos últimos 40 anos – reafirma-se mais forte do que nunca ao atrair a atenção de diversos outros campos, especialmente a educação escolar.

Empreendedorismo social: modo de ser

A Ashoka, que cunhou o termo e ajudou a construir o campo, define o empreendedorismo social considerando os atributos e as qualidades que caracterizam o(a) empreendedor(a) social e sua ideia:

  • Seu perfil ou qualidade empreendedora: uma forte motivação para mover recursos de uma área de baixo para uma área de grande impacto social.
  • Possuir uma ou mais ideias inovadoras: novas abordagens para problemas sociais com o potencial de mudar um ou mais sistemas.
  • Ser criativo: ter a capacidade de solucionar problemas e sempre buscar saídas para obstáculos que encontra pelo caminho.
  • O impacto social de suas ideias: as mudanças sistêmicas resultantes de suas ações.
  • A fibra ética: para que esse impacto seja sempre orientado para o bem comum e alcançado por meios éticos.

Por esse conjunto de critérios já se percebe que o empreendedorismo social não é simplesmente algo que se faz, mas uma maneira de ser e estar no mundo. Por isso, se queremos que os aprendizados do empreendedorismo social contribuam com a educação escolar, precisamos ir muito além das abordagens mais utilitárias que o reduzem a um mero conjunto de conteúdos disciplinares. Ao contrário, é preciso voltar às suas origens: o que contribui para que as pessoas cultivem e desenvolvam as competências e habilidades que associamos ao empreendedor social?

Para responder a essa pergunta, a Ashoka realizou um diagnóstico de sua rede global de mais de 4.000 empreendedores sociais em 91 países. Ao olhar suas biografias, foram analisados os fatores que contribuíram para que eles, desde cedo, se dedicassem para o bem comum de maneira empreendedora. Dentre estes, cerca de 800 atuam diretamente com crianças e jovens e têm como objetivo principal contribuir para seu protagonismo social. Por isso também foram analisadas as suas estratégias e metodologias para compreender os principais fatores que contribuem para o sucesso de suas empreitadas.

01 – Desse estudo se pode observar quatro modos ou condições de existência dos empreendedores sociais:

  • Compreender a si mesmo: cultivar a consciência de suas paixões, motivações, habilidades e limitações, combinadas com o compromisso de trabalhar para melhorar a si mesmo.
  • Criar senso de propósito e autopermissão: desenvolver uma compreensão da mudança que se deseja ver no mundo e se permitir correr riscos para persegui-la.

02 – Modos de conhecer

  • Ler o mundo e compreender o campo social: saber como a transformação social acontece, conhecendo os principais caminhos para a mudança estrutural e sistêmica.
  • Conhecer a comunidade através do engajamento: criar relações horizontais com a comunidade e público para conhecer seus desafios e suas fortalezas.

03 – Modos de pensar

  • Pensar de maneira sistêmica: cultivar a capacidade de analisar um problema de maneira sistêmica e aprender a criar hipóteses sobre o que seria necessário para transformá-lo.
  • Definir problemas, projetar soluções: ser capaz de definir um problema e projetar uma solução que leve em consideração consequências intencionais e não intencionais.
  • Pensar criativamente: desafiar o pensamento para além do imediatismo do desafio em questão para visualizar o mundo como ele deveria ser.
  • Pensar com foco nos resultados: aprender a alinhar atividades e táticas com resultados mensuráveis a curto e longo prazo e traçar caminhos para o sucesso.

04 – Modos de conviver

  • Comunicar de forma clara e convincente: ser capaz de criar e comunicar novas narrativas ou paradigmas que anunciem as potências das novas soluções e mobilizem as pessoas.
  • Construir alianças e equipes: ser capaz de estabelecer conexões com colegas e equipes para formar arranjos transformadores capazes de aumentar o impacto social das soluções.

“Uma escola que garante diversos tipos de aprendizados contribui para os projetos de vida ao conectar aquilo que o mundo espera de nós com as nossas próprias potências e capacidades.

Educação transformadora

É o conjunto desses quatro modos que leva, finalmente, às formas de fazer que caracterizam o empreendedorismo social. Estes dependem de pelo menos quatro competências de uma educação transformadora:

  • Empatia: é a capacidade de conhecer seus próprios sentimentos e ideias, conhecer os sentimentos e ideias dos outros e, mais que isso, conectar-se com eles, saindo do eu para, a partir de outros olhares, adentrar uma visão mais abrangente e profunda do mundo. Só através dessa capacidade de estar verdadeiramente aberto àquilo que o outro apresenta, o indivíduo estará apto a refinar sua capacidade analítica, compreendendo diferentes contextos e, com isso, contribuir na busca por transformar o mundo.
  • Criatividade: apostar na força da criatividade é reconhecer os estudantes como sujeitos ativos de suas próprias aprendizagens, uma vez que só se aprende na interação com o mundo natural, social e cultural, na produção de conhecimento e cultura e não na assimilação e reprodução de conteúdos previamente elaborados. Além de valorizar a autoria dos estudantes, de estimular diferentes linguagens e formas de expressão, do incentivo para criar soluções novas para problemas, cultivar a criatividade é antes de tudo abrir espaço para o exercício cotidiano da liberdade.
  • Trabalho em equipe com liderança compartilhada: é a capacidade de cooperar e trabalhar em parceria, na diversidade, empreendendo ações conjuntas visando a resultados comuns. Ela se constrói principalmente através da vivência dos estudantes com seus pares, em grupos auto-organizados, em um ambiente democrático e ético, onde todos podem trazer contribuições e aprender juntos em nome do compromisso com o bem comum. As relações entre as pessoas mudaram e os modelos hierárquicos de liderança, marcados tradicionalmente pelo autoritarismo e pela rigidez, não têm mais espaço. A liderança hoje, mais do que nunca, deve ser compartilhada.
  • Protagonismo social: todos somos, em nossa essência, iniciadores. A cada nascimento, ressurge a esperança da renovação e transformação do mundo. Trata-se, portanto, de uma qualidade inerente ao ser humano, mas que deve ser cuidada para que floresça com vigor. Protagonismo social é a capacidade de tomar iniciativas para o bem comum, buscando ativamente engajamento coletivo. O protagonista social é aquele que reconhece sua potência e assume postura ativa nos processos de transformação da realidade, orientando-se para a resolução prática dos problemas.

Uma educação transformadora, portanto, é aquela que entende, cultiva e potencializa essas quatro competências em toda a comunidade escolar. Uma escola que garante as condições para esses tipos de aprendizados contribui para os projetos de vida das juventudes (como preconiza a competência geral 6 da bncc), mas em conexão com aquilo que o mundo espera de nós e a partir das suas próprias potências e capacidade de transformação.

Um mundo de pessoas que transformam

sse processo, tanto para as novas gerações quanto para a comunidade escolar como um todo, só pode ser uma jornada, uma caminhada. Ela parte, como vimos nos modos de existência empreendedora, da construção do “eu” (identidade), passando pelo encontro com o “outro” (alteridade), até chegar ao “nós” (comunidade). Por isso, quando me perguntam como as escolas podem contribuir para um mundo de pessoas que transformam, convido a olhar o aprendizado que vem das comunidades escolares que já fazem parte desse movimento: invariavelmente elas começam com uma jornada de descoberta de todos os membros da comunidade escolar, e especialmente das crianças e jovens, como sujeitos de transformação.

Mas não basta alguém se reconhecer como transformador: é preciso querer transformar o mundo. É o encantamento com o mundo que desperta a vontade de tomá-lo para si, cuidar dele e de tudo que nele existe. As competências transformadoras, combinadas com uma postura afetiva, ética e que coloca a autoria, a criação e a agência dos estudantes em primeiro lugar, ajudam a criar esse senso de responsabilidade pelo mundo e a fazer com que assumam um papel protagonista nas mudanças, renovações e cuidados demandados pelas diferentes realidades de hoje e de amanhã.

Flavio Bassi 

é antropólogo, educador popular e biólogo. Foi fundador e diretor executivo da Ocareté, atuando no campo socioambiental com povos indígenas e comunidades tradicionais, além de diretor regional da Ashoka para o sul da África. Atualmente é vice-presidente da Ashoka na América Latina, onde também dirige a sua estratégia de Infância e Educação.

Para saber mais

  • Ashoka: ashoka.org
  • Programa Escolas Transformadoras: escolastransformadoras.org.br
  • Série “Corações e Mentes: Escolas que Transformam”: www.videocamp.com/pt/playlists/coracoes-e-mentes-escolas-que-transformam  
  • Movimento de Inovação na Educação: movinovacaonaeducacao.org.br

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Todos transformadores

O empreendedorismo social colabora para a formação de jovens protagonistas na renovação e atualização do mundo.

O mundo hoje está em constante e acelerada transformação. Por um lado, está cada dia mais evidente a nossa profunda interdependência. Por outro, as revoluções tecnológicas e das comunicações afetam, como nunca, todas as dimensões de nossas vidas. São os jovens, em especial, que enfrentam o maior desafio face a essas mudanças, pois devem projetar suas vidas justamente nesse momento de transição.

Como podem encontrar soluções para um mundo que parece avançar mais rápido do que a nossa capacidade de responder ao que ele nos demanda? O jeito é fazer com que a quantidade de soluções exceda a quantidade de problemas e isso só é possível se todos nós formos sujeitos de transformação social positiva. Isso significa que precisamos desafiar o paradigma atual que ainda prepara as novas gerações para um mundo hierárquico, vertical, cindido em áreas e departamentos do saber e do fazer e orientado para a satisfação dos desejos e das necessidades individuais imediatos por meio da eficiência na repetição.

É face a essa virada civilizatória que o empreendedorismo social – um campo em construção nos últimos 40 anos – reafirma-se mais forte do que nunca ao atrair a atenção de diversos outros campos, especialmente a educação escolar.

Empreendedorismo social: modo de ser

A Ashoka, que cunhou o termo e ajudou a construir o campo, define o empreendedorismo social considerando os atributos e as qualidades que caracterizam o(a) empreendedor(a) social e sua ideia:

  • Seu perfil ou qualidade empreendedora: uma forte motivação para mover recursos de uma área de baixo para uma área de grande impacto social.
  • Possuir uma ou mais ideias inovadoras: novas abordagens para problemas sociais com o potencial de mudar um ou mais sistemas.
  • Ser criativo: ter a capacidade de solucionar problemas e sempre buscar saídas para obstáculos que encontra pelo caminho.
  • O impacto social de suas ideias: as mudanças sistêmicas resultantes de suas ações.
  • A fibra ética: para que esse impacto seja sempre orientado para o bem comum e alcançado por meios éticos.

Por esse conjunto de critérios já se percebe que o empreendedorismo social não é simplesmente algo que se faz, mas uma maneira de ser e estar no mundo. Por isso, se queremos que os aprendizados do empreendedorismo social contribuam com a educação escolar, precisamos ir muito além das abordagens mais utilitárias que o reduzem a um mero conjunto de conteúdos disciplinares. Ao contrário, é preciso voltar às suas origens: o que contribui para que as pessoas cultivem e desenvolvam as competências e habilidades que associamos ao empreendedor social?

Para responder a essa pergunta, a Ashoka realizou um diagnóstico de sua rede global de mais de 4.000 empreendedores sociais em 91 países. Ao olhar suas biografias, foram analisados os fatores que contribuíram para que eles, desde cedo, se dedicassem para o bem comum de maneira empreendedora. Dentre estes, cerca de 800 atuam diretamente com crianças e jovens e têm como objetivo principal contribuir para seu protagonismo social. Por isso também foram analisadas as suas estratégias e metodologias para compreender os principais fatores que contribuem para o sucesso de suas empreitadas.

01 – Desse estudo se pode observar quatro modos ou condições de existência dos empreendedores sociais:

  • Compreender a si mesmo: cultivar a consciência de suas paixões, motivações, habilidades e limitações, combinadas com o compromisso de trabalhar para melhorar a si mesmo.
  • Criar senso de propósito e autopermissão: desenvolver uma compreensão da mudança que se deseja ver no mundo e se permitir correr riscos para persegui-la.

02 – Modos de conhecer

  • Ler o mundo e compreender o campo social: saber como a transformação social acontece, conhecendo os principais caminhos para a mudança estrutural e sistêmica.
  • Conhecer a comunidade através do engajamento: criar relações horizontais com a comunidade e público para conhecer seus desafios e suas fortalezas.

03 – Modos de pensar

  • Pensar de maneira sistêmica: cultivar a capacidade de analisar um problema de maneira sistêmica e aprender a criar hipóteses sobre o que seria necessário para transformá-lo.
  • Definir problemas, projetar soluções: ser capaz de definir um problema e projetar uma solução que leve em consideração consequências intencionais e não intencionais.
  • Pensar criativamente: desafiar o pensamento para além do imediatismo do desafio em questão para visualizar o mundo como ele deveria ser.
  • Pensar com foco nos resultados: aprender a alinhar atividades e táticas com resultados mensuráveis a curto e longo prazo e traçar caminhos para o sucesso.

04 – Modos de conviver

  • Comunicar de forma clara e convincente: ser capaz de criar e comunicar novas narrativas ou paradigmas que anunciem as potências das novas soluções e mobilizem as pessoas.
  • Construir alianças e equipes: ser capaz de estabelecer conexões com colegas e equipes para formar arranjos transformadores capazes de aumentar o impacto social das soluções.

“Uma escola que garante diversos tipos de aprendizados contribui para os projetos de vida ao conectar aquilo que o mundo espera de nós com as nossas próprias potências e capacidades.

Educação transformadora

É o conjunto desses quatro modos que leva, finalmente, às formas de fazer que caracterizam o empreendedorismo social. Estes dependem de pelo menos quatro competências de uma educação transformadora:

  • Empatia: é a capacidade de conhecer seus próprios sentimentos e ideias, conhecer os sentimentos e ideias dos outros e, mais que isso, conectar-se com eles, saindo do eu para, a partir de outros olhares, adentrar uma visão mais abrangente e profunda do mundo. Só através dessa capacidade de estar verdadeiramente aberto àquilo que o outro apresenta, o indivíduo estará apto a refinar sua capacidade analítica, compreendendo diferentes contextos e, com isso, contribuir na busca por transformar o mundo.
  • Criatividade: apostar na força da criatividade é reconhecer os estudantes como sujeitos ativos de suas próprias aprendizagens, uma vez que só se aprende na interação com o mundo natural, social e cultural, na produção de conhecimento e cultura e não na assimilação e reprodução de conteúdos previamente elaborados. Além de valorizar a autoria dos estudantes, de estimular diferentes linguagens e formas de expressão, do incentivo para criar soluções novas para problemas, cultivar a criatividade é antes de tudo abrir espaço para o exercício cotidiano da liberdade.
  • Trabalho em equipe com liderança compartilhada: é a capacidade de cooperar e trabalhar em parceria, na diversidade, empreendendo ações conjuntas visando a resultados comuns. Ela se constrói principalmente através da vivência dos estudantes com seus pares, em grupos auto-organizados, em um ambiente democrático e ético, onde todos podem trazer contribuições e aprender juntos em nome do compromisso com o bem comum. As relações entre as pessoas mudaram e os modelos hierárquicos de liderança, marcados tradicionalmente pelo autoritarismo e pela rigidez, não têm mais espaço. A liderança hoje, mais do que nunca, deve ser compartilhada.
  • Protagonismo social: todos somos, em nossa essência, iniciadores. A cada nascimento, ressurge a esperança da renovação e transformação do mundo. Trata-se, portanto, de uma qualidade inerente ao ser humano, mas que deve ser cuidada para que floresça com vigor. Protagonismo social é a capacidade de tomar iniciativas para o bem comum, buscando ativamente engajamento coletivo. O protagonista social é aquele que reconhece sua potência e assume postura ativa nos processos de transformação da realidade, orientando-se para a resolução prática dos problemas.

Uma educação transformadora, portanto, é aquela que entende, cultiva e potencializa essas quatro competências em toda a comunidade escolar. Uma escola que garante as condições para esses tipos de aprendizados contribui para os projetos de vida das juventudes (como preconiza a competência geral 6 da bncc), mas em conexão com aquilo que o mundo espera de nós e a partir das suas próprias potências e capacidade de transformação.

Um mundo de pessoas que transformam

sse processo, tanto para as novas gerações quanto para a comunidade escolar como um todo, só pode ser uma jornada, uma caminhada. Ela parte, como vimos nos modos de existência empreendedora, da construção do “eu” (identidade), passando pelo encontro com o “outro” (alteridade), até chegar ao “nós” (comunidade). Por isso, quando me perguntam como as escolas podem contribuir para um mundo de pessoas que transformam, convido a olhar o aprendizado que vem das comunidades escolares que já fazem parte desse movimento: invariavelmente elas começam com uma jornada de descoberta de todos os membros da comunidade escolar, e especialmente das crianças e jovens, como sujeitos de transformação.

Mas não basta alguém se reconhecer como transformador: é preciso querer transformar o mundo. É o encantamento com o mundo que desperta a vontade de tomá-lo para si, cuidar dele e de tudo que nele existe. As competências transformadoras, combinadas com uma postura afetiva, ética e que coloca a autoria, a criação e a agência dos estudantes em primeiro lugar, ajudam a criar esse senso de responsabilidade pelo mundo e a fazer com que assumam um papel protagonista nas mudanças, renovações e cuidados demandados pelas diferentes realidades de hoje e de amanhã.

Flavio Bassi 

é antropólogo, educador popular e biólogo. Foi fundador e diretor executivo da Ocareté, atuando no campo socioambiental com povos indígenas e comunidades tradicionais, além de diretor regional da Ashoka para o sul da África. Atualmente é vice-presidente da Ashoka na América Latina, onde também dirige a sua estratégia de Infância e Educação.

Para saber mais

  • Ashoka: ashoka.org
  • Programa Escolas Transformadoras: escolastransformadoras.org.br
  • Série “Corações e Mentes: Escolas que Transformam”: www.videocamp.com/pt/playlists/coracoes-e-mentes-escolas-que-transformam  
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Educar para viver em sociedade

Educar para viver em sociedade

Educação em valores deve ser coletiva, prioritária e intencional.

Professor, gestor escolar e doutor em Psicologia pela Universidade de Valladolid (Espanha), José María Avilés Martinez é uma referência global em estratégias de combate ao bullying, ao cyberbullying e aos diferentes fenômenos que afetam a convivência escolar. Tendo como base seu trabalho em Valladollid, Martinez tem colaborado com grupos de pesquisa no Brasil e acompanhado pessoalmente a implantação de suas ideias, traduzidas na metodologia Prires. Em sua última visita ao país, a Educatrix foi conhecer mais sobre a metodologia e o trabalho do educador.

Educatrix: A agenda de temas urgentes em educação é ampla em todo o mundo. Entre tantas prioridades, qual é o lugar da educação em valores e do tema da convivência escolar?

José María Avilés Martinez: O trabalho das escolas no campo dos valores é crucial e deve ser central, porque se trata de um tema transversal que impregna a atuação de todos os agentes educativos. Em uma sociedade democrática, que demanda da escola a formação de cidadãos para o futuro, é imprescindível que a escola exerça esse mandato de forma consciente. Por isso, é importante explicitar a educação em valores como uma tarefa planejada, intencional e compartilhada por todos de forma colaborativa, sejam famílias, professores ou o próprio alunado.

Educatrix: A convivência escolar permite aprender sobre valores?

J.M.A.M. Sim! A convivência escolar é um ambiente privilegiado por colocar em jogo esses valores. Ao pô-los em prática, permite-se aprendê-los a partir de situações espontâneas e habituais, como conflitos, ou por meio de circunstâncias planejadas, que trabalham intencionalmente valores como o respeito, a solidariedade, a tolerância e a igualdade. Uma escola pode, por meio de seu Plano de Convivência e das atuações a partir dele, planejar o trabalho em valores com reflexões e debates coletivos de suas experiências, propondo práticas sistematizadas com o uso das melhores estratégias.

Educatrix: Qual é a melhor definição de bullying e como diferenciá-lo do cyberbullying?

J.M.A.M. Trata-se do mesmo fenômeno, embora com diferenças decisivas. Em ambos existem três componentes definidores: o desequilíbrio de poder que torna o agressor mais forte que sua vítima (física, social, digital ou psicologicamente); a intencionalidade expressa em situações planejadas para causar dano; e a recorrência ou a repetição que leva os atores a persistirem em um cenário em que ambos ocupam posições de domínio ou submissão diante dos olhos de testemunhas. Assim, a definição de assédio pode ser maus-tratos repetidos entre jovens em idade escolar, mantidos ao longo do tempo, quase sempre longe dos olhos dos adultos, com a intenção de humilhar e sujeitar abusivamente uma vítima indefesa por um agressor ou grupo com resultados de vitimização psicológica e rejeição de grupo. Já o cyberbullying acontece quando um sujeito recebe repetidas agressões abusivas por meio de mídias móveis ou ambientes virtuais, com o objetivo de prejudicá-lo e a seu status social, reduzir as chaves socioemocionais e tirar proveito do anonimato. A vítima está em uma posição ainda pior do que no bullying com relação àqueles que a maltratam. Quem sofre vitimização tem menos segurança, menos controle e mais imprevisibilidade. Quem pratica o abuso deixa de reconhecer os sentimentos da vítima por agir do outro lado de uma tela, não recebe feedback do sofrimento e isso torna deficitário o 

O pilar decisivo é a intenção educacional das ações implementadas, um olhar que permite construir processos a partir dos alunos, do que são, do que têm, do que sentem e com um impacto explícito no que os motiva e os preocupa.

Seu pensamento sobre as consequências de seus atos. Contextualmente, o cyberbullying aumenta o número de testemunhas e prolonga a permanência do dano enquanto as imagens ou os vídeos ofensivos ainda forem propagados na rede.

Educatrix: Há uma tendência a piorar o problema do cyberbullying?

J.M.A.M. É importante abordar o fenômeno educacionalmente, porque se nada for feito os problemas podem aumentar e os sujeitos envolvidos podem se sentir muito mal e procurar soluções enganosas de fuga. Até agora, o que muitas escolas fizeram foi proibir dispositivos em seu ambiente; outras permitem o seu uso, mas mantêm uma distância educativa que não fornece pistas ou critérios para o relacionamento que os jovens estabelecem. A atuação da instituição deve ser proativa e preventiva, fornecendo critérios razoáveis ​​para os alunos tomarem decisões corretas na gestão de seus relacionamentos na internet. Com as famílias, é preciso ter diretrizes de suporte e supervisão do relacionamento com os dispositivos, regulando o tempo, o conteúdo e os locais de uso. Com o corpo docente, no currículo escolar, apoiar o uso positivo das redes sociais para a aprendizagem dos alunos e para o trabalho colaborativo. Esse conjunto de ações vale tanto para o enfrentamento dos riscos da rede, como para uma utilização saudável desses dispositivos digitais pelos alunos, para que se tornem autônomos, independentes, respeitosos e felizes em usá-los.

Educatrix: O bullying é um problema estritamente escolar?

J.M.A.M. O bullying não é um fenômeno estritamente escolar. Acontece na escola, sim, mas como um reflexo da própria sociedade. Na escola, chamamos isso de bullying entre iguais; na família, de violência de gênero, abuso de idosos ou abuso de crianças; no local de trabalho, chamamos de assédio moral. Poderíamos continuar em outros setores sociais ou políticos, colocando rótulos diferentes em processos semelhantes. Trata-se de um problema social de se exercer o poder de maneira abusiva, de violência replicada em diferentes espaços de relacionamento. Portanto, a reflexão sobre intimidação e maus-tratos entre iguais nos leva a um pensamento mais geral, sobre como concebemos nossos relacionamentos interpessoais, sobre como exercemos poder e que espaço damos aos direitos de outras pessoas em nossa interação. Em resumo, devemos pensar em como colocamos em jogo os valores do relacionamento e da convivência democrática em nossos ambientes próximos. Se a escola deve continuar a ser um motor de transformação social, é a partir dela que vamos trabalhar para a construção de valores de solidariedade, respeito, justiça e igualdade, modelos de relacionamentos interpessoais saudáveis, em que a cultura do cuidado e da ajuda impere frente à imposição e ao abuso.

Educatrix: Como pesquisador, diretor e educador, você construiu uma visão multidisciplinar sobre o cyberbullying que resultou em uma metodologia de referência. O que diz essa metodologia?

J.M.A.M. Apresentei recentemente o Prires, um programa educacional para orientar a gestão de redes sociais e em situações de cyberconvivência que está sendo aplicado nas escolas espanholas com a colaboração de famílias, professores e até estudantes que atuam como tutores de seus companheiros mais jovens. Fundamentalmente, essa abordagem multidisciplinar me ajudou a ter uma perspectiva de trabalho muito coletiva, colaborativa e participativa com os colégios que assessoro e com os diferentes agentes educacionais. Assim, trabalhamos com os professores em estruturas como as equipes de convivência e os tutores, e entre os alunos com estruturas criadas por nós, como equipes de ajuda ou equipes de mediação. A orientação sobre bullying e cyberbullying baseia-se no trabalho preventivo de valores e convivência escolar. É um caminho de ida e de volta. Valores e boa convivência são trabalhados para evitar o assédio moral e, ao mesmo tempo, temos estratégias específicas para lidar com o abuso de colegas, porque sabemos que apenas trabalhar na convivência escolar não é suficiente.

Educatrix: Quais são os pilares do seu trabalho?

J.M.A.M. Os pilares fundamentais são: o trabalho proativo e preventivo contra medidas reativas; a construção de estratégias de equipe que promovam ações coletivas previamente debatidas e acordadas contra soluções individualistas; a implementação de processos de baixo para cima, ou seja, que surgem da necessidade das equipes que tomam decisões e que tornam suas respostas originais e não repetíveis, sempre projetadas para os problemas da própria escola. Por fim, o pilar decisivo é a intenção educacional das ações implementadas, um olhar que permite construir processos a partir dos alunos, do que são, do que têm, do que sentem e com um impacto explícito no que os motiva e os preocupa. O envolvimento dos estudantes na solução de seus problemas é uma condição indispensável. Sem dúvida, também é preciso uma visão recíproca: os professores e os adultos precisam acreditar no lado positivo dos alunos para ajudá-los a alcançar seus próprios objetivos.

Educatrix: Quais os primeiros passos para uma escola que, a partir de agora, quer resolver a questão do bullying?

J.M.A.M. Em geral, começar por estratégias conjuntas, porque o assédio e a intimidação são abordáveis quando os enfrentamos de maneira coordenada, levando em consideração a perspectiva e a cultura das famílias, a liderança e o conhecimento dos professores e equipes de gestão das escolas e o protagonismo dos estudantes como um grupo que não permite que comportamentos de assédio sejam instalados na sua própria cultura de convivência. Depois, aumentar a conscientização sobre a importância de trabalhar juntos para resolver o problema. É necessária sinergia entre professores, famílias e estudantes para que sejam competentes para dar uma resposta eficaz a essas situações e/ou atos de intimidação; construir protocolos e medidas preventivas para impedir que as ações de abuso se tornem fortes em contextos em que o silêncio e o consentimento prevalecem. Essas ações só são possíveis ao refletirmos como comunidade educacional na implementação de valores positivos que vão contra os valores de intimidação, como imposição, abuso, medo, coerção ou desrespeito. Trabalhar valores como tolerância, coragem, empatia, compaixão, assertividade e solidariedade dentro dos grupos faz com que a sala de aula adote outras atitudes e exemplos, que se tornam predominantes no discurso institucional da escola e no discurso informal dos alunos, ocupando o espaço, o tempo e os idiomas do grupo.

Educatrix: Você visitou escolas brasileiras e trabalhou com pesquisadores daqui. O desafio brasileiro é semelhante ao enfrentado em outros países?

J.M.A.M. Cada país tem seus desafios, suas vantagens e desvantagens, dependendo do seu desenvolvimento educacional e de sua cultura escolar. Nos últimos anos, transferimos para algumas escolas e grupos de pesquisa metodologias de convivência que estão obtendo resultados muito bons. Esses dados revelam diferenças entre os estudantes de nossos países em relação à adesão a valores como justiça, respeito, solidariedade e convivência democrática, em geral, justificados pelos diferentes trabalhos dos sistemas educativos sobre valores e pelas diferenças na sistematização das tarefas do corpo docente para promover a convivência escolar. O Brasil, como outros países, enfrenta um desafio de trabalhar este tema, a fim de generalizar estratégias educacionais eficazes e conscientizar os professores e as equipes de gestão sobre seu papel decisivo na implementação dos Planos de Convivência e no trabalho em valores.

Educatrix: Como adotar a abordagem que você propõe?

J.M.A.M. As escolas devem se olhar e se encontrar. Cada escola tem valor em si mesma para a tomada de boas decisões. É verdade que muitas escolas precisam de força, orientação e treinamento de pessoas que já fizeram essa jornada com outros grupos e que conhecem as etapas para alcançar os objetivos propostos. Estamos dispostos a ajudá-las nesse trânsito. O importante, mais do que o ponto de destino, são os processos que a própria escola constrói entre seus pares nessa viagem. Mas insisto, é necessário contar com as pessoas que formam a escola; sem elas, a viagem em si não será possível, nem se construirá qualquer coisa. Assessoramos e formamos equipes de gestão e de professores que desejam implementar planos de convivência ou projetos antibullying. Fornecemos materiais de formação e professores profissionalmente competentes em convivência em diferentes perspectivas e técnicas de trabalho que possibilitam a internalização dos valores democráticos nas escolas. No entanto, isso só será possível se os membros da comunidade escolar se envolverem, quiserem mudar o que fazem e procurar saídas ponderadas para seus problemas de coexistência e para a construção de valores futuros.

Educatrix: Qual é a relação entre educação em valores, qualidade de convivência e desempenho acadêmico?

J.M.A.M. Existem vários estudos que apoiam essa ideia e várias instâncias educativas já reconhecem na certificação acadêmica das qualificações dos alunos sua participação em ações relacionadas à promoção de valores e à construção de uma convivência positiva em seu entorno. Isso também se deve à demanda das empresas que buscam em seus colaboradores novas habilidades além do desempenho acadêmico de egressos, como a capacidade de trabalhar em grupo, a competência para resolver problemas de perspectivas inovadoras ou criativas ou habilidades para se colocar no lugar do outro. Finalmente, estudos recentes como o da Fundação BBVA sobre boas práticas educacionais na Espanha ou o estudo realizado por mim na Universidade de Valladolid, em escolas de Castilla e León, fornecem dados a esse respeito. As pesquisas identificam o trabalho em valores como um dos indicadores relevantes para o desempenho acadêmico, a eficácia e o sucesso escolar entre os alunos das escolas, que estão cada vez mais preocupadas em incluir em seu planejamento estratégico a implementação de valores para a construção da convivência democrática.

Para saber mais

  • MARTINEZ, J. Bullying: guia para educadores. Campinas: Mercado de Letras, 2013.
  • MARTINEZ, J. Educar en las Redes Sociales. Programa preventivo PRIRES. Bilbao: Desclée de Brouwer, 2018.
  • MARTINEZ, J.; PETTA, R. Los Sistemas de Apoyo entre Iguales (SAI) para el fomento de la convivencia en positivo, la mejora del clima de aula y la prevención de situaciones de bullying: La experiencia de Brasil y de España. European Journal of Child Development, Education and Psychopathology, v. 6, n. 1, p. 5-17, 2018. Disponível em: mod.lk/aviles. Acesso em: 9 fev. 2020.

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Até onde vai o impacto da inovação na educação

Até onde vai o impacto da inovação na educação

De novas tecnologias e práticas na melhoria do aprendizado em diferentes países.

Quando se discute a necessidade de inovar em sala de aula para desenvolver com os estudantes de hoje as habilidades que eles vão precisar no futuro, uma das grandes dificuldades que se encontra é saber onde, como e qual a efetividade das inovações educacionais. A inovação na educação pode ser vista como indutora de mudanças nos sistemas educacionais pelo mundo? Qual o papel da tecnologia nesse processo? Para responder essas e outras questões, a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) divulgou o relatório Measuring Innovation in Education 2019 (“Medindo a Inovação na Educação”, em livre tradução).

De acordo com a publicação, que examinou 139 práticas de ensino fundamental e médio em bancos de dados como o PISA (Programa Internacional de Avaliação de Alunos), TIMMS (Tendências Internacionais nos Estudos de Matemática e Ciência) e o PIRLS (Estudo Internacional sobre o Progresso do Letramento em Leitura), mensurar a inovação e entender como ela funciona é essencial para melhorar a qualidade dos sistemas. Mesmo sem ter informações sobre o Brasil, com o estudo em mãos formuladores de políticas públicas podem saber o que está dando certo no exterior para ter um melhor respaldo na hora de realizar intervenções e direcionar os recursos.

Para avaliar inovações na educação, o documento parte de três perspectivas: comparação da educação com outros setores, identificação de mudanças significativas nos sistemas educacionais e construção de métricas para verificar a relação entre a inovação e as mudanças nos resultados educacionais.

Antes de descrever os resultados, primeiro é importante determinar o que é inovação em educação, segundo a OCDE. “Inovação está relacionada à adoção de novos serviços, tecnologias, processos e competências por instituições de ensino que levem à melhora de aprendizagem, equidade e eficiência”, diz o documento.

Apesar das inovações serem moderadas, alunos de sistemas dentro da média da OCDE têm experimentando diferentes práticas de ensino e aprendizagem em comparação aos seus pares nos últimos dez anos. Entre uma das maiores mudanças, está a aquisição de conhecimento independente, já que mais estudantes usam computadores e podem buscar informações para ampliar as discussões em sala de aula.

Ainda que as inovações não estejam necessariamente relacionadas ao uso de tecnologia, o documento destaca que as TICs (Tecnologias da informação e Comunicação) têm se apresentado como um importante motor de mudança.

Entre os professores, o relatório também apresentou mudanças práticas. A proporção de docentes que participaram nas últimas décadas de atividades de aprendizagem entre pares aumentou, enquanto o treinamento formal permaneceu estável.

O documento aponta que a inovação não deve ser vista como um fim, mas como um meio de melhorar resultados educacionais. Em média, os países avaliados que mudaram suas práticas pedagógicas conseguiram melhorar os resultados acadêmicos dos estudantes e aumentaram o nível de satisfação e diversão na escola.

Na hora de indicar o que impulsiona a inovação, o documento aponta seis fatores de destaque: Recursos humanos: habilidades e abertura para inovação por parte de atores do setor educacional; Organização de aprendizagem: organização e capacidade das instituições para gerar conhecimento e aprimorar práticas.

“Inovação está relacionada à adoção de novos serviços, tecnologias, processos e competências por instituições de ensino que levem à melhora de aprendizagem, equidade e eficiência”

Tecnologia: aplicação de tecnologias na educação, particularmente de big data. Regulação e organização do sistema: a inovação só ganha força em ambientes onde boas ideias podem ser implementadas e não são encobertas por diretrizes com muita aversão ao risco para currículos ou processos de avaliação. Pesquisa educacional: o investimento em pesquisa e avaliação é considerado um elemento chave para o ecossistema de inovação. Desenvolvimento educacional: como acontece em outros setores, a educação também deve buscar desenvolver ferramentas inovadoras, organizações e processos para melhorar e mudar suas práticas.

A seguir, selecionamos algumas conclusões do estudo a partir da associação entre inovação e resultados acadêmicos, além do peso do investimento financeiro. Trata-se de uma maneira de ajudar atores em diferentes níveis do processo educativo a entender se as mudanças estão se traduzindo em melhoria nas escolas e salas de aula, bem como se estão em linha com o que foi planejado inicialmente.

Resultados acadêmicos

Fundamental 1: No ensino fundamental, o mesmo professor geralmente ensina todas as áreas do conhecimento, o que sugere que a inovação pode ter um efeito interdisciplinar e estar vinculada a todos os resultados da aprendizagem. Isso acontece positivamente tanto em letramento, quanto em matemática e ciências.

Fundamental 2 e Médio: Existe uma pequena associação positiva entre a inovação nas práticas de ensino e a mudança média nos resultados da aprendizagem em matemática e ciências. Como existe um professor para cada área, há menos chance de fertilização cruzada entre inovação em matemática e educação em ciências. A inovação no ensino de ciências tem sido positivamente associada com a melhoria dos resultados da aprendizagem na última década, enquanto que com a inovação na educação matemática isso não acontece. Isso nos lembra que a inovação não leva necessariamente a uma melhoria nos resultados desejados, exatamente como as reformas políticas às vezes falham. Por outro lado, também reforça o tempo necessário para que a inovação produza seus efeitos.

Investimentos financeiros

A inovação na educação pode ser feita com poucos ou muitos recursos. A conectividade e o uso pedagógico de TICs durante as aulas pode depender de um determinado nível de equipamento e infraestrutura, além da formação de equipes técnicas. Dada a estabilidade e até mesmo a pequena diminuição no acesso às TICs, não se deve esperar investimento em larga escala. Algumas inovações podem requerer formação de professores, mas também demandar a participação em cursos informais, que também envolvem algum custo (como o tempo da equipe).

Mudar as práticas de ensino e aprendizagem pode demandar novos conhecimentos, crenças ou atitudes, e isso pode exigir algum investimento para: produção de novos conhecimentos, comunicação, facilitação da aprendizagem entre pares, por meio de posts no blog da escola ou revisões sistemáticas de evidências existentes, ou ainda reuniões internas da escola e a participação em conferências promovidas por outras organizações.

Texto Marina Lopes e Vinicius de Oliveira, do Portal Porvir

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